Pelespírito

Pelespírito

Zélia Duncan completa 40 anos de carreira em 2021 e, para a felicidade dos fãs, entrega dois álbuns novos. O primeiro, Minha Voz Fica, conta com versões de músicas da compositora Alzira E; já o segundo, Pelespírito, traz 15 faixas inéditas escritas por Duncan em parceria com o compositor Juliano Holanda. “Começamos a fazer muitas coisas com bastante intensidade e profundidade”, conta Duncan em conversa com o Apple Music. Então a cantora, que hoje mora em São Paulo, pegou o carro e passou três dias no Rio de Janeiro para gravar o álbum inédito. Pelespírito também ganha novos contornos por ser o primeiro álbum em que Zélia Duncan gravou a própria voz. “Isso sempre será um grande diferencial deste álbum. É interessante como o som dele ficou muito bonito. Quando eu ouvi as faixas em caixas de estúdio, chorei. Não precisei regravar nada. E o som dele ficou muito orgânico. Se você ouvir com cuidado, com fones de ouvido, vai ouvir os detalhes e vai parecer que eu estou cantando do seu lado.” Apesar da pandemia do coronavírus, a cantora conseguiu se manter bem ativa, diante das circunstâncias: produziu músicas, criou álbuns, gravou clipes, participou de projetos e até escreveu um livro. “Não é fácil. Tenho amigos maravilhosos que ficaram paralisados, porque a nossa profissão de artista está muito debilitada e comprometida. A cultura está muito desprestigiada e nós não podemos trabalhar. Isso também paralisa a gente de tristeza”, conta. Para manter a sanidade durante um tempo tão complicado, a cantora revela que corre diariamente, além de conversar com o seu público em suas redes sociais. “Já estou aqui há muito tempo, mesmo assim eu quero ser uma pessoa atual, que participa do jeito que dá e que consegue.” Mesmo com tantas coisas ruins, “esperança” parece a palavra de ordem para Duncan, que não desanima em meio a tantas adversidades. O foco da artista é no futuro e no que ainda pode vir por aí. “Sei que quando ‘abrir a porteira’, vou correr para abraçar a minha mãe do jeito que eu realmente quero, e depois com certeza vou subir no palco. A abstinência do palco é muito grande.” Com tanto tempo de estrada, Zélia Duncan acredita que a importância da música em sua vida continua a mesma. “Nada é mais importante para mim, e isso não muda”. No entanto, ela entende que a relação das pessoas com as produções musicais é o que mais mudou desde o início de sua carreira: “Antes você acompanhava tudo no encarte do álbum e já sabia de tudo. Quem gostava de música, sabia de tudo. Você acompanhava o roteiro. O Pelespírito, por exemplo, das pessoas que vão ouvir, quantas você acha que vão seguir a ordem que eu estou sugerindo? Acho que você não é obrigado a ouvir desse jeito, mas é tão legal quando você aceita um convite do artista.” Então Zélia Duncan nos convida para fazer essa viagem por Pelespírito e conta detalhes e curiosidades de cada uma das 15 faixas do álbum. Pelespírito “Escrevi essa letra de uma vez. Eu estava esperando para fazer uma live com a Bruna Linzmeyer e, quando faltavam uns 15 minutos, me sentei na frente do celular e estava angustiada, como todos nós, sem saber o que ia acontecer, sentindo um vazio, naquela montanha-russa cotidiana, porque a vida é uma montanha-russa, mas a gente está num momento da vida em que de manhã você está lá em cima, na hora do almoço você está lá em baixo, no lanche você está subindo de novo, sem saber a hora em que você vai descer outra vez. Então eu estava num dia totalmente assim. Me sentindo uma coisa oca, sentindo saudade de tudo, sentindo esse luto – e nem tinha morrido tanta gente ainda, mas o luto da nossa vida, né? Cada um de nós tem um luto para digerir. E eu estava em um dia especialmente assim. Então peguei um papel e comecei a escrever ‘Eu tô pele e espírito’, como quem diz: ‘Eu estou realmente por um fio’. Até usei esta expressão ‘estou por um fio dessa minha blusa’ e eu brinquei com o ‘tô musa’, porque eu ia conversar com a Bruna Linzmeyer, e as meninas mais novas brincam muito com isso de ‘musa’ só porque a gente está mais velha. É uma faixa extremamente existencial, mas que fala de coisas que pouca gente ouviu até agora. Me emociono muito com essa música, nem sei como vai ser a primeira vez que eu cantá-la em público, porque me vem um nó na garganta ao pensar em quanta gente está se sentindo assim, quanta gente não segurou a onda e foi embora. Acho que ao mesmo tempo tem a ver com a minha personalidade de estar em casa, e estar na causa apesar de estar em casa, sem tirar os olhos do mundo, e é isso que me faz ir para a rede, é isso que me faz conversar tanto com os meus colegas que me procuram e com quem trocamos muitas coisas, é tudo isso. Eu me casei no meio da pandemia, sabe? Me mudei para São Paulo, porque eu ia ficar com a minha namorada e ficamos um ano na mesma casa. E de repente descobrimos que nos dávamos muito bem morando juntas. Então sabe essa ‘mistureba’ de alegria com tristeza? ‘Pelespírito’ é isso, a pele é a matéria e o espírito é a elevação, a possível elevação que a própria arte nos dá.” Onde É Que Isso Vai Dar? “Essa é uma música muito importante para esse álbum, ela foi composta antes de ‘Pelespírito’ e por causa dela eu tomei a decisão de gravar um álbum, porque ela é muito forte. E ela nasceu de uma conversa minha com o Juliano Holanda, que é o meu parceiro em todas as faixas. Ele é um poeta, uma cara que também adora escrever. A gente começou uma conversa, e ele disse para mim: ‘Está me salvando esse negócio de a gente compor, está sendo muito bom pra mim, para suportar estes dias’. E eu disse para ele: ‘Te digo o mesmo: você me provoca e eu adoro desafios’. E essa música começa assim. Então a faixa é quase um diálogo da gente e, no final, eu digo: ‘A nossa vida anda com pressa, mas eu prefiro perguntar onde é que isso vai dar, como é que isso vai ser, porque estamos sem saber’. O álbum tem três perguntas e essa é uma delas. E tem um detalhe importante nessa música: eu toco violão e faço a voz, e o meu grande amigo Christian, que mora em Londres, gravou os outros instrumentos no estúdio dele e me mandou. É uma música que é um pedaço grande do coração desse álbum.” Tudo Por Nada “‘Tudo Por Nada’ foi a última música a ser feita para o álbum, que teria 14 faixas, mas por causa dessa, viraram 15. A gente já tinha feito a seleção para o álbum, mas a gente não parou de compor, então, quando veio essa música, eu disse para o Juliano: ‘Que inferno! Eu não consigo deixá-la de fora’. E eu gosto muito dela porque fala de uma coisa que também foi uma sacada da pandemia. Eu estava vendo uma palestra da Márcia Tiburi, e ela estava falando sobre você só conseguir sentir o outro se você tiver um fio dentro de você, e aí eu fiz uma letra toda inspirada nisso. O Juliano colocou um arranjo bem brasileiro, um pouco regional. Enfim, é uma faixa que eu adorei ter feito.” Vou Gritar Seu Nome “’Vou Gritar Seu Nome’ tem a participação de Leo Brandão tocando um acordeon, e sou eu que toco violão. Nessa faixa, somos só ele e eu, e é uma música muito suave, é como se fosse uma espécie de parquinho de diversões. É uma canção que as pessoas ouvem com um sorriso no rosto, é uma música suave que sonha com um futuro um pouco mais leve.” Nossas Coisinhas “Essa é uma música muito fofa que eu fiz. É uma canção de amor em que eu também toco sozinha, porque os meninos disseram que ela era tão íntima que era melhor eu tocar só. É para ouvir bem ao pé do ouvido, uma música totalmente de amor e que fala das nossas coisinhas de menina.” Viramos Pó? “Essa é a outra pergunta do álbum. Uma faixa que fala bem do nosso momento. É um country que tem um refrão muito legal, e é uma música que também me emociona muito ao cantar, porque fala bem do que estamos vivendo. Acho que faz algumas perguntas que o mundo também está se fazendo.” Raio de Neon “É uma balada bem gostosa e uma das músicas mais leves do álbum. São essas vontades de a gente se distrair, de virar a página.” Nas Horas Cruas “’Nas Horas Cruas’ é o rock ’n’ roll do álbum, que também fala bem do nosso tempo e que também tem uma pergunta no meio dela: ‘Quais são as armas que usamos dentro de casa, nas horas cruas, sem nada?’. Eu escolho o amor. Estou falando dos nossos dias, se for o fim do mundo, e se lá no final de tudo você estiver me esperando, a gente vai conseguir reconstruir alguma coisa.” Sua Cara “Sua Cara’ eu fiz para o meu pai. Eu perdi meu pai em dezembro, não foi de COVID-19, ainda bem, mas meu pai estava velhinho. É uma hora estranha, e eu fiz bem para ele. O que eu acho interessante é que, às vezes, a gente tem um motivo para compor que não é o motivo pelo qual você gosta da música, por isso acho que explicar muito não é nem o caso. É um blues em que eu também toco sozinha, é uma faixa bem emotiva.” Passam “Essa fala das horas, dos dias. Uns dias voam, outros se arrastam, mas todos eles passam. Quando estávamos no começo do isolamento, era tão difícil saber o que era o quê, e o comum era achar que os dias eram iguais, a gente perdia a noção deles.” O Que Se Perdeu? “Essa é terceira pergunta do álbum. É um diálogo meu com o Juliano. Eu falo: ‘Seu remédio meu, meu remédio seu. Minha cura, sua cura. O que se perdeu?’. Meio falando literalmente dos remédios e também do que a gente perdeu, tentar entender por que que a comunicação está tão difícil.” Eu e Vocês “’Eu e Vocês’ também foi gravada pela Elba Ramalho e é uma música muito suave, uma balada simples, daquelas para acalmar a alma, para descansar. Eu falo de coisas simples de que a gente gosta e de que a gente precisa... É uma música que eu fiz para o público, me dá vontade de cantar num coro essa canção, com voz de multidão, é meio eu morrendo de saudade de vocês.” Eu Moro Lá “‘Eu Moro Lá’ é diferente do resto do álbum porque ela tem um swing gostoso. Eu fiz essa letra para o Juliano porque ele mora num lugar que tem uma janela que dá de frente para o rio Capivari, é uma vista enorme, então é como se ele estivesse falando: ‘Eu moro lá porque lá tem horizonte e um monte de céu’. E eu também entrei numa onda de que essa letra tem a ver com um Brasil que não é esse, é aquele, e eu não moro nesse, eu moro lá. Um Brasil que tem rosto, não o Brasil que a gente está vivendo hoje.” Você é Rainha “’Você é Rainha’ é uma faixa muito sensível, é uma música que eu dedico às mulheres que sofreram na pandemia, sofreram assédio dentro de casa, muitas morreram, as que sofrem trancadas por seus algozes. Essa é uma música dedicada a essas mulheres.” Vai Melhorar “Para não dizerem que eu só fico falando de coisa difícil, né? Essa faixa é uma porta aberta para um futuro em que a gente vai ser mais feliz.”

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