A jornada da Legião Urbana é repleta de improbabilidades. Tem início na história de um garoto nascido no Rio de Janeiro em 1960 que conviveu com muitas mudanças, morou até em Nova York, mas se encontrou, mesmo, quando se mudou para Brasília aos 11 anos de idade e foi acolhido por um grupo de amigos autodenominado Turma da Colina. Esse mesmo rapaz foi apresentado à gravadora EMI-Odeon como Trovador Solitário pelos colegas Herbert Vianna e Bi Ribeiro, dos Paralamas do Sucesso, mas acabou se consagrando mesmo à frente de uma legião. Amparado pela guitarra melódica de Dado Villa-Lobos e a bateria precisa de Marcelo Bonfá (e pelo baixo sólido e composições de Renato Rocha entre 1984 e 1989), Renato Russo colocou a Legião Urbana e, por consequência Brasília, no centro gravitacional do punk e do rock brasileiro daquela década. O rapaz, que não tinha muito de rockstar – era tímido, magricela, usava óculos de lentes quadradas, mas tinha um vozeirão potente –, transformou as poesias sobre o tédio adolescente no cerrado brasileiro, e as inspirações do movimento post-punk de bandas inglesas como The Smiths, The Cure e Joy Division, em combustível para se conectar com uma geração inteira frustrada com o desamparo econômico e a desesperança política daqueles meados dos anos 80. Se Legião Urbana (1985), o primeiro álbum do grupo, não foi um sucesso absoluto, apesar de músicas icônicas e inconformistas como “Será” e “Geração Coca-Cola”, o trabalho seguinte, Dois (1986), vendeu 600 mil cópias com uma mistura cativante de conscientização política (“Índios”) e paixões improváveis (“Eduardo e Mônica”) e colocou a banda no topo. E lá a Legião permaneceu até 1996, ano em que Renato Russo morreu. A banda lançou sete álbuns de estúdio com o vocalista (além de registros ao vivo, coletâneas e gravações póstumas) e sempre se recusou a seguir fórmulas padronizadas do pop e rock – “Faroeste Caboclo”, um dos grandes sucessos da banda, tocava à exaustão nas rádios apesar de ter quase dez minutos de duração, e foi até transformado em filme em 2013 – e por isso, se conecta com a rebeldia da juventude até hoje.