

Não é simples entender o que diferencia Tension (2023) dos outros álbuns de Kylie Minogue. Ela entrega tudo o que esperamos de seus 35 anos de indiscutível potência na cultura pop – com melodias alegres e irretocáveis e seu magnetismo arrebatador. Mesmo assim, há uma qualidade inexplicavelmente subjetiva em Tension, que faz de sua sonoridade algo familiar, mas com frescor de novidade. “Acho que é uma confiança natural de quem se aceita e sabe onde está”, conta Minogue ao Apple Music. “Tenho mais a dizer e ficou mais fácil fazer isso.” Após Golden, álbum de 2018 inspirado na música country, e DISCO, projeto para espantar a tristeza lançado em 2020, no auge do período de isolamento social, o ícone pop australiano começou a trabalhar no que se tornaria seu 16º álbum de estúdio com um único propósito: “Que não seja chato.” Richard “Biff” Stannard, produtor das Spice Girls, que trabalha com Minogue desde seu triunfante retorno à música pop em Light Years, de 2000, foi a primeira opção. “Biff entende de pop, de indie, sabe ser cool e me conhece. Adoramos passear por diferentes sonoridades e gêneros, então é um bom jeito de começar”, explica Minogue. “Aos poucos e sem pressão. No começo, buscamos apenas deixar rolar.” A leveza e o divertimento são pontos centrais de Tension. Isso está claro na iluminada faixa homônima, inundada de erotismo, algo que também está presente em “Things We Do For Love” – uma explosão de dance-pop efervescente de alta frequência – e em “Hands”, em que Minogue faz um rap (sim, é isso mesmo). Esta edição deluxe também traz três faixas extras, incluindo “Somebody To Love”, um midtempo suave e cheio de sintetizadores que surgiu nas primeiras gravações do álbum. “Nós a resgatamos para entrar como faixa bônus. Pensei: ‘Nós amamos essa música!’ É como um abraço”, conta Minogue. E, é claro, “Padam Padam”, faixa pulsante feita para lotar as pistas e colocar o mundo em um estado viral de emergência pop, carinhosamente apelidada de “Padam-ic” [pandêmica, em português], ao ser lançada em maio de 2023. “Quem diria que começaria assim? Foi a cereja do bolo”, explica Minogue sobre “Padam Padam”. Mas não é de se surpreender que Minogue novamente destrua qualquer expectativa – ela não faz nada por acaso. “É na determinação, na crença e na inspiração de histórias humanas e da vida real que minha música desempenha seu papel”, revela. “Não me interpretem mal, há dias em que simplesmente não sei como fazer isso. O equilíbrio é uma luta. Mas sou determinada e adoro o processo.” Continue a leitura para descobrir mais sobre cada música de Tension, nas palavras da artista: Padam Padam “Ao ouvir a demo, já adorei. Eu pensei: ‘Isso é incrível.’ E então, depois que gravei meus vocais, pensei: ‘Além do mais, é incrível para mim.’ Eu realmente me senti como se fosse uma parte da música e nós nos tornamos maiores do que as partes somadas.” Hold On To Now “Eu amo esta música profundamente. A melodia ‘na-na-na’ vem de uma nota vocal que enviei para Biff [Stannard] em 2021; alguns meses depois, a gente construiu a faixa a partir dela. Acho a sonoridade linda. Ouvi recentemente em um som de alta fidelidade e me senti totalmente transportada – me conectei e percebi uma ‘outra’ versão de mim. Eu realmente me permiti desfrutar a música. Adoro sentir que estou fazendo perguntas que são, ao mesmo tempo, existenciais e urgentes. Mas tem a ver com uma busca – quando você se preocupa demais em procurar respostas, esquece de viver o presente. É por isso que esta música mexe comigo. Eu realmente me identifico com isso.” Things We Do For Love “A palavra que fica nesta música é ‘cardio’. Tem um clima meio Footloose – Ritmo Louco [filme de 1984]. Não tem trégua, o andamento é contínuo e a energia sobe. ‘Things We Do For Love’ foi composta no mesmo dia que ‘Tension’, quando [as compositoras e produtoras britânicas] Kamille e Anya [Jones] chegaram. Demoramos para terminá-la, tivemos que entender seu desenho para mantê-la contínua. Tem uma estrutura incomum, mas acho que deu muito certo.” Tension “A primeira versão dela estava meio confusa. Eu não sabia se entraria no álbum. A letra era nervosa, a voz robótica era ainda mais exagerada – soava muito clubber. À medida em que evoluiu, a música se tornou mais suave e refinada. Novamente, foi o formato que me chamou a atenção – é como uma montanha-russa, há pequenas sustentações que a equilibram. A introdução com as batidas de piano leva você para cima, cada vez mais perto do clímax, então a música fica nervosa... Depois cai. O baixo aparece e você voa novamente nesta montanha-russa. Então, na segunda vez que isso está prestes a acontecer, você já sabe o que esperar e seu nível de entusiasmo fica ainda maior, porque você sabe o quão emocionante é.” One More Time “Começou como outra música. A gente chegou a parar sua produção, mas gostei tanto do que estava surgindo que não quis desperdiça-la. Na semana em que estivemos em Surrey [para um acampamento de composição com os amigos Duck Blackwell (Halsey) e Jon Green (Paloma Faith)], tive outra ideia para a parte ‘Slow down/ Work it on out’ [Desacelere/ Faça acontecer] que era o oposto do que a gente tinha. Jon veio com ‘I know your star sign/ What’s on your bedside’ [‘Eu conheço seu signo/ O que está na sua mesa de cabeceira] e achei isso muito fofo. Ficou leve e divertido. A letra retrata, se não um relacionamento, pelo menos um flerte – podendo ou não ser romântico. Não é algo muito profundo, mas há uma liberdade nisso.” You Still Get Me High “Esta começou com Biff e Jon Green e era mais lenta, mais tranquila. Eu queria entender se havia algum potencial nela, então a mencionei para Duck um dia: ‘Eu adoraria ter sua opinião sobre esta música e que você fizesse parte dela.’ Acho que a combinação de Biff, Duck, Jon e eu faz com que a gente melhore uns aos outros. Grande parte da euforia vem de Jon, que é ‘o que sente’, e de Biff, com seu cérebro pop permanentemente ligado. Já Duck faz com que tudo combine com o restante do álbum. É como se fosse uma música de dupla personalidade – eu particularmente adoro o final, com todos os seus improvisos.” Hands “Meu gerente na gravadora, Jamie Nelson, enviou a demo de ‘Hands’ com a seguinte introdução: ‘Eu sei que você não é uma rapper, mas tive essa ideia…’ E, é claro, eu estava muito curiosa e disposta a tentar, mas tive que trabalhar muito para que ela se transformasse em algo meu. Teria sido melhor se eu soubesse antes que o vocal [na demo] era uma voz masculina manipulada para parecer feminina. Depois de saber disso, foi mais fácil entender por que era tão difícil interpretar a introdução. Então, no início do primeiro verso, eu não canto – deixamos [o vocal demo] na faixa –, mas no restante, sim. É o tipo de música divertida para dias ensolarados: se alguém começar a cantar uma parte, você vai querer continuar. Não tem como parar. Ouvi a demo pela primeira vez no carro com um amigo – com as janelas abertas e o sol brilhando – e fez todo sentido.” Green Light “‘Green Light’ me surpreendeu. Talvez porque pareça ser ‘prima’ de ‘Spinning Around’ [do álbum Light Years de 2000], mas isso não fica tão evidente, ela é bem arejada e tranquila. Teve uma festa para a audição dela em um clube de Nova York e, antes de tocarmos a música, eu disse: ‘Não há muitos momentos relaxantes e tranquilos no álbum, pode ser que este seja um deles”. Eu não poderia estar mais enganada. Às vezes você realmente não pode adivinhar. Ela tem um groove.” Vegas High “Eu estava fazendo uma residência em Las Vegas, então fui com Biff e Duck conhecer [o artista e escritor] Gerard O'Connell. Nós quatro nos apertamos em um pequeno estúdio para fazer uma música que falasse sobre a cidade. Era a missão do dia. Queríamos uma versão romantizada e cinematográfica de Las Vegas – dirigir até Las Vegas, quando as estradas estão empoeiradas e brilhantes, é quase como um oásis. Ou, em um voo noturno no meio do nada, de repente você se depara com aquele pequeno país das maravilhas de Las Vegas – e a história se desenrolou rapidamente. ‘Capture the magic and hold it in your hand.’ [Capture a magia e segure-a em sua mão] Eu gravei ali mesmo.” 10 Out Of 10 (Oliver Heldens feat. Kylie Minogue) “Originalmente, esta era uma música para o [DJ holandês] Oliver Heldens. A equipe dele entrou em contato com a minha aleatoriamente e eu pensei: ‘Gostei, já vejo as pessoas dançando na pista.’ A garota que fez a demo tem uma voz selvagem – bem diferente da minha – e uma atitude natural. Eu jamais quis soar como uma cópia mal feita de algo, mas, como ia gravar sozinha, resolvi arriscar. Estava livre para aproveitar a parte boa da música, depois dar um tempo, olhar de fora e entender se havia funcionado. Ela não foi planejada para o álbum, mas nós resolvemos abraça-la e acho que somou muito bem.” Story “Foi significativo escrever esta música. Prefiro não entrar em detalhes, mas tive que superar algumas coisas e passei por um período difícil. Reconhecer isso agora me faz bem. Tem um sentimento que está entre a solidão de um momento triste e o apoio das pessoas que lhe acolhem, aconteça o que acontecer, que eu não consigo expressar em palavras, mas falo através da minha música. Depois da superação, você percebe que as pessoas que lhe ajudaram nunca terão a dimensão do quanto fazem parte da sua história de uma forma que você jamais poderá retribuir. Fiquei muito encantada com a quantidade de pessoas que vieram até mim nas festas de audição do álbum para dizer que amaram ‘Story’. Fiquei comovida. E acho que faz sentido, pois não se trata apenas de falar sobre mim e sobre as pessoas que eu amo, mas também de falar com meus ouvintes. E cada um vai entender de uma maneira.”