Não Vejo a Hora

Não Vejo a Hora

Após Insular (2013), o ex-vocalista e baixista do Engenheiros do Hawaii Humberto Gessinger lançou repertórios em formatos menores (singles, EPs), mas só agora sentiu que tinha um acervo de músicas para um álbum completo. O trabalho intitulado de Não Vejo a Hora traz 11 faixas, oito gravadas com um power trio (trio elétrico) que traz, além de Gessinger, os músicos Felipe Rotta e Rafa Bisogno; e três com um trio acústico, com Nando Peters e Paulinho Goulart. “Não Vejo a Hora é uma expressão que aparece num par de canções. Acho que é um desabafo, mas um desabafo otimista. Ao mesmo tempo que tem aquela coisa de ‘tá foda’, mas tem a esperança de que a hora chegue”, explica Humberto Gessinger. “Não sou muito bom para escrever canções motivacionais, porque sou por natureza um cara mais melancólico, mas, mesmo do meu jeito, a gente pode sempre falar sobre as possibilidades de que as coisas melhorem. O famoso metade do copo cheio.” “As canções também ressaltam um pouco essa coisa da passagem do tempo. Sempre gostei de sentir as influências do tempo na minha vida, adoro olhar paras as minhas mãos e ver que tenho um monte de calos de passar os dias tocando baixo. Ver meu cabelo embranquecer. Não é uma coisa que me angustia não”, completa Humberto Gessinger, no auge de seus 55 anos e mais de 30 de carreira. Confira o faixa a faixa do novo álbum: 1. “Partiu” “Como falei, são 11 canções, as letras são todas minhas, mas tem quatro parcerias. ‘Partiu’ é uma dessas que escrevi sozinho e é a música mais direta das 11. Não chega a ser motivacional, porque não sou capaz de escrever coisas assim, de animar o pessoal, mas ela é uma música em busca de força. Gosto muito de acompanhar os campeonatos de tênis, lembro de ver na TV, com a guitarra desligada no colo. Acho muito interessante quando os tenistas começam a falar sozinho, buscando força dentro de si. Acho que esta música fala um pouco sobre isso de uma forma direta e por isso a escolhi para abrir o álbum, e também porque já na introdução ela tem baixo com guitarra, ela deixa bem claro qual vai ser a sonoridade do álbum, são trios, uma sonoridade minimalista, cheia de espaços que gosto de deixar.” 2. “Um Dia de Cada Vez” “‘Um Dia de Cada Vez’ também foi gravada com power trio e coloquei na sequência de ‘Partiu’ porque em termos do papo, dão um passo à frente. Depois de buscar forças dentro de ti, você tem que construir resiliência e paciência para viver um dia de cada vez. Já na introdução ela mostra outro artifício que uso para aumentar as possibilidades do trio, que são os teclados que toco com o pé ao mesmo tempo que toco baixo. Ela abre com essa sonoridade, com o teclado dobrando a guitarra e tematicamente ela dá uma sequência a ‘Partiu’, que abriu o álbum.” 3. “Bem a Fim” “‘Bem a Fim’ foi gravada com o trio acústico. Na verdade, gravei violão, Nando Peters, no baixo acústico; e Paulinho Goulart no acordeon. É uma parceria com o Steban Tavares, que tocou comigo no período do ‘Insular’. Ela faz essa brincadeira no refrão com ‘Highway to Hell’ [música do AC/DC], ela fala: ‘A Highway to Hell faz a curva e vai pro céu, quando a resposta vem de outro lado alguém dizendo que está tudo bem’. É uma canção que é aparentada com ‘Perfeita Simetria’, que é uma música do ‘O Papa É Pop’ [álbum do Engenheiros do Hawaii, de 1990], e ‘Vida Real’, que é uma música do ‘Humberto Gessinger Trio’ (1996). São músicas onde um telefonema é o personagem central da trama. A diferença aqui é que o final da história é feliz. É a primeira parceria que aparece no álbum e a primeira das três do trio acústico.” 4. “Algum Algoritmo” “Volta o power trio, guitarra, baixo e bateria. Rafa Bisogno na bateria, Felipe Rotta na guitarra e eu no baixo. Ela já abre explorando as notas agudas que tenho no baixo de seis cordas e musicalmente fala como são imprevisíveis as relações humanas. É muito difícil um algoritmo ler assim, juntar causa e consequência que nem sempre, quase nunca, são ligadas por uma linha reta na nossa vida. Ela lista várias coisas, diferenças entre duas pessoas que se dão bem e que não veem a hora de estarem juntos, mas que não assistem à mesma série, não escolhem o mesmo chá, discordam da temperatura ambiente.” 5. “Calmo em Estocolmo” “‘Calmo em Estocolmo’ eu escrevi na Suécia [quando Gessinger passou um mês visitando a filha, que mora no país], andando pelas ruas de lá, com uma melancolia, com uma sensação triste, pensando em com a gente podia estar em outro estado, vivendo de outra maneira aqui. A letra fala: ‘Estava calmo em Estocolmo, tudo em paz. Ah, meu Deus, será que agora os vikings somos nós?’. De uma certa forma, a barbárie que já fez parte da história dos povos, em épocas idas, talvez a gente esteja vivendo de novo tudo agora. Uma reflexão de quem está longe. Acho que de longe você vê com mais clareza os problemas e as potencialidades do lugar de onde tu vem. Esta música pensa um pouco sobre isso.” 6. “Olhou pro Lado, Viu” “Ela está do lado de ‘Calmo em Estocolmo’ porque é da mesma leva, nasceu também andando pelas ruas de Estocolmo, vendo aquelas torres onipresentes, torres de castelos, de igreja, já fiz uma analogia às torres de telefonia, que ficam emitindo dados. Isso me levou a pensar em drones, em pássaros que podem voar pela sua cabeça. Olhou pro lado, viu. Olhou pro alto, viu. É uma parceria com o Felipe Rotta, que é o guitarrista que está tocando comigo há dois anos, e foi gravada pelo power trio. Foi esta canção que me deu a ideia de usar a torre na capa. Acabou virando uma torre de xadrez, e depois virou uma torre de xadrez colorida [para mostrar que nem tudo é preto no branco], isso nasceu nesta canção.” 7. “Fetiche Estranho” “‘Fetiche Estranho’ e ‘Estranho Fetiche’ são duas metades de uma mesma música. Acho que é uma característica que tenho, de ter ouvido muito as bandas progressivas dos anos 70, que gravavam álbuns conceituais, com músicas com várias partes, é uma coisa que fiz em ‘Perfeita Simetria’ e ‘O Papa É Pop’, que são a mesma música com letras diferentes. O Nando Peters, que toca baixo no trio acústico, me passou a música e fiz a letra em duas partes. Elas são complementares, as duas falam sobre a maneira fetichista como muitas pessoas veem o passado, pintando ele com cores douradas, como se tudo tivesse sido sempre melhor ou que vai ser melhor no futuro, uma maneira de fugir do presente, mas, especificamente, elas falam muito sobre essa coisa do passado. Gosto muito dessa molecada que não viveu os anos 80 vir falar de uma maneira saudosa dos anos 80. Foram anos legais, mas agora também é. E agora a gente tem que fazer com que seja o melhor momento que tem. Então são duas partes da mesma canção, a primeira se foca mais na coisa do tempo mesmo, do fetichismo do tempo.” 8. “Maioral” “‘Maioral’ é um sanduíche entre ‘Fetiche Estranho’ e ‘Estranho Fetiche”, ela tem o power trio e as outras duas são com o trio acústico. Queria dar um tempo entre as duas canções, ‘Fetiche Estranho’ e ‘Estranho Fetiche’, precisava desse tempinho de reflexão antes de ir pra segunda parte. ‘Maioral’ fala sobre isso, como tudo é transitório, como isso deveria nos ensinar a ser um pouco mais humildes. ‘Não se surpreenda se o próximo for você’, a música fala. Tem uma frase que fala: ‘Um dinossauro e uma ficha telefônica têm o mesmo tamanho, pois agora tanto faz porque eles estão extintos’. Como a noção dessa transitoriedade deveria nos tornar mais humildes, mais generosos. Então ela está ali separando as duas canções acústicas, mas falando do mesmo tema.” 9. “Estranho Fetiche” “Esta segunda parte uso pra falar sobre alguns ícones musicais. Artistas e bandas que me influenciaram e até da jogadora Marta, da seleção brasileira feminina de futebol, [além de] ícones pop. Encaixei esses ícones pop nesse papo da música, que critica um pouco esse fetichismo com relação ao tempo. Não gosto de ser fetichista com relação às coisas do passado, como se fossem melhores.” 10. “Outro Nada” “Ela é uma parceria com o Bebeto Alves, que é um músico muito importante para o que a gente chama de ‘MPG’, Música Popular Gaúcha dos anos 70, que seria o equivalente a MPB. É muito interessante o trabalho do Bebeto, e ele é um cara que vem da fronteira, tem muita milonga, que é um ritmo regional aqui nosso. Ele me mandou essa milonga e botei a letra, logo me remeteu a essa relação entre o centro e periferia, capital e interior. É uma coisa que é muito presente na música nordestina também, que é uma música de migrantes, gente que está chegando na capital, na rodoviária, ansiedade sobre o mundo que vai encontrar. Ela fala sobre isso e é influenciada pelo trabalho do Bebeto Alves, que tem uma força regional muito grande.” 11. “Missão” “Selecionei ‘Outro Nada’ e ‘Missão’ para fecharem o álbum porque são parcerias que já foram gravadas pelos meus parceiros. ‘Outro Nada’, do Bebeto Alves, e ‘Missão’, do Duca Leindecker, para o álbum mais recente dele. Ela também tem uma coisa regional forte, ela cita a coisa dos Sete Povos das Missões, as Sete Quedas do Rio Paraná, tem esse lado. Mas fala sobre uma procura interna, que realmente é o roteiro que foi escrito para a gente e se a gente vai querer segui-lo ou não. Ela fecha o ciclo. Enquanto ‘Partiu’ é uma música que fala de buscar forças para seguir adiante, acho que ‘Missão’ tem um pouco disso. O refrão diz: ‘Vá sem culpa, sem medo de errar’. Então fecha mais ou menos remetendo a ‘Partiu’, que foi a música que abriu o disco.”

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